15 de janeiro de 2010

‘Héróis’ do Grande Irmão




É hoje, a multidão se agita para o tradicional espetáculo que se inicia. A fórmula deu certo, pois passa ano, entra ano, promove uma comoção da multidão que, atualizada, já puxou a “ficha corrida” de todas as feras que serão confinadas numa “jaula de luxo”, em busca de um milhão e meio de verdinhas.
Como grande protagonista e “olho onipresente” está o mesmo personagem há exatos dez anos. Jornalista ‘conceituado’ que todo ano assume o papel de animador de auditório ou domador de leões no circo onde as feras se digladiam para serem a nova celebridade instantânea, que cairá nas graças da multidão de anestesiados a cada paredão.
Assim como em “1984”, de George Orwell, no pano de fundo há o olho totalitário que tudo vê. Nosso Grande Irmão promove uma lavagem cerebral onde a vítima desse programa de condicionamento não é o senhor “Winston Smith”, mas sim os milhões de paralisados pelo festival de intrigas, individualismo, falsos companheirismos, fofocas e corpos torneados.
Celebridades instantâneas são cada vez mais constantes na televisão, vide a Geisy Arruda, trazendo o futuro para o presente e antecipando a previsão de Andy Warhol, de que “no futuro todo mundo terá seus 15 minutos de fama”. O salto do anonimato para o estrelato move esses “abnegados” que comovem a multidão anestesiada, ao derramarem lágrimas frente às câmeras, falando do “estresse” de ficarem enclausurados longe de suas famílias na “prisão de luxo”, das grandes festas e paqueras.
Como de praxe, as chamadas “minorias” sempre estão presentes; não podendo faltar o afro-descendente e aquela pessoa, que decidiu escolher amar aquele do mesmo sexo, e que estão ali para, segundo eles, representarem o grupo ao qual pertencem. Junto a eles, um ou dois senhores (as) de meia idade – que ficarão com os papéis de paizão e mãezona - e mais algumas figuras estereotipadas, como o pseudo-intelectual e os saradões e gostosonas de pouco conteúdo.
Voltando ao animador de palco, que há dez anos repete frases e bordões, fica com ele o papel de comandar a massa vislumbrada com o mundo divino da televisão, que tem em fórmulas, como o Grande Irmão, a salvação da lavoura, sem trocadilho com nenhuma “Fazenda”, nessa verdadeira “guerra santa”, que se tornou a busca pelos picos de audiência.
Todo esse cenário de condicionamento coincide com o ano eleitoral onde a multidão deveria estar acompanhando acontecimentos, o programa de partidos, investigando a vida pregressa de postulantes, daqueles que deveriam ser os verdadeiros “heróis” nessa farsa maquiada, chamada de “democracia representativa”, mesmo que seja para ter a convicção de que nenhum deles presta para si.
Mas como estes “representantes” estão cada vez mais desacreditados e, eles próprios, veem todo esse cenário de forma bem cômoda, resta à multidão anestesiada adotar as celebridades instantâneas como seus “heróis” num País, onde infelizmente, contrariando Bertold Bretch, ainda necessita-se de heróis.


Júlio César Carignano
Editorial Gazeta do Paraná (12-01-10)